RABO ESCONDIDO COM A RATA(ZANA) DE FORA

A presidente do parlamento do MPLA, Carolina Cerqueira, rejeitou hoje o pedido da UNITA (o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite em Angola) de discussão sobre os limites orçamentais de endividamento do Estado (do MPLA) por alegado incumprimento da lei, dizendo que o assunto será debatido “no momento certo”. Ou seja, tudo indica que será no dia 30 de Fevereiro de 2024…

O grupo parlamentar da UNITA (julgando que Angola é o que não é – um Estado de Direito democrático) remeteu hoje à mesa da Assembleia Nacional (Parlamento) um requerimento pedindo a discussão dos limites orçamentais de endividamento do país, como ponto prévio antes da aprovação do Orçamento Geral do Estado (OGE) 2024 no plenário, uma iniciativa rejeitada.

A UNITA, na sua exposição, recorda que o Parlamento aprovou por unanimidade, em 14 de Novembro passado, a solicitação ao executivo da Estratégia Geral de Endividamento do País a Médio e Longo Prazos, pedindo por isso explicações sobre os eixos do referido plano para o povo angolano (onde se incluem os 20 milhões de pobres) saber quanto Angola deve, a quem deve e qual a respectiva taxa de juro.

No documento apresentado ao plenário e de forma genérica pelo primeiro secretário de mesa da Assembleia Nacional, Manuel Dembo, a UNITA recorda que a Lei da Sustentabilidade das Finanças Públicas estabelece o limite de 60% do Produto Interno Bruto (PIB).

“Este limite foi em muito ultrapassado em 2021, foi ultrapassado em 2022 e continua a não ser respeitado em 2023. Para 2024, o executivo já nos está a dizer que não vai respeitar o limite que a lei estabelece. O rácio da dívida pública, que não deve ultrapassar 60% do PIB, já se situa nos 84% do PIB”, afirma a UNITA.

A UNITA pede mesmo esclarecimentos ao executivo do MPLA há 48 anos e ao Parlamento sobre os “constantes desrespeitos” dos limites orçamentais de endividamento, questionado a “legitimidade” do órgão legislativo em aprovar um OGE 2024 que vai afectar quase 60% das suas receitas para pagar dívida.

A proposta do OGE 2024, que fixa despesas e estima receitas globais avaliadas em 24,7 biliões de kwanzas (27,9 mil milhões de euros), foi aprovada hoje na globalidade.

Pelo menos 57,8% do total da despesa do Orçamento para o exercício económico de 2024, estimado em 14,3 biliões de kwanzas (16 mil milhões de euros), será alocado ao serviço da dívida pública, interna e externa, como refere o orçamento. Na ocasião, a presidente do parlamento do MPLA, Carolina Cerqueira, pediu explicações extraordinárias ao ministro de Estado para a Coordenação Económica, José de Lima Massano, para reagir ao requerimento apresentado pela UNITA.

José de Lima Massano, na sua intervenção, deu nota que a questão do endividamento do Estado foi abordada durante as discussões na especialidade da proposta do OGE 2024, referindo que a Estratégia de Endividamento de Médio Prazo 2022-2024 “é um documento público”.

Relativamente ao Plano Anual de Endividamento para 2024, explicou, será elaborado quando o orçamento for aprovado e publicado para o ano de 2024. “Logo de seguida deveremos tornar publico também esse plano anual de endividamento”, prometeu.

Liberty Chiyaka, presidente do Grupos Parlamentar da UNITA, rebateu, na ocasião, os argumentos do ministro de Estado, afirmando que este “não respondeu” a todas as questões por si colocadas no requerimento.

Carolina Cerqueira justificou, na sua intervenção, que a plenária desta quarta-feira tinha como ponto único a votação final do OGE para fundamentar a rejeição da proposta da UNITA.

“Todas as outras questões adjacentes não são aqui chamadas, foi feito o esclarecimento e, no momento, certo teremos a oportunidade de discutir essas questões”, vincou, sem mais detalhes.

Eis, na íntegra o texto do requerimento apresentado pela UNITA:

«O objectivo é obter de Sua Excelência Presidente da Assembleia Nacional e dos Auxiliares do Titular do Poder Executivo esclarecimentos sobre informação relevante que impacta a aprovação da Lei do OGE pela Assembleia Nacional.

No quadro da aprovação da Proposta de Lei do OGE no passado dia 14 de Novembro, a Assembleia Nacional aprovou por unanimidade a solicitação ao Executivo da Estratégia Geral de Endividamento do País a Médio e a Longo Prazos. Os Deputados aprovaram este pedido, porque estamos convencidos de que o Povo soberano de Angola precisa de saber quanto dinheiro Angola deve, a quem deve, qual a taxa de juro, e por quanto tempo mais o futuro das nossas crianças continuará hipotecado.

Esta informação e outra relativa à observância das regras de execução do OGE é imperativa para podermos aprovar tanto a Proposta de Lei inscrita na Ordem do Dia como os orçamentos futuros. Os angolanos todos precisam desta informação. A Assembleia Nacional não deve votar sem esclarecimento sobre estas questões.

Cerca de 60% das despesas no OGE 2024 são para pagar dívidas já contraídas. O Senhor Presidente da República quer que este Parlamento aprove novas dívidas e lhe autorize a contrair dívidas sem limite, sem obedecer a uma estratégia pré-definida e sem respeitar os limites do endividamento.

A Lei da Sustentabilidade das Finanças Públicas estabelece o limite de 60% do PIB. Este limite foi – em muito – ultrapassado em 2021, foi ultrapassado em 2022 e continua a não ser respeitado em 2023. Para 2024 o Executivo já nos está a dizer que não vai respeitar o limite que a Lei estabelece. O rácio da Dívida Pública, que não deve ultrapassar 60% do PIB, já se situa nos 84% do PIB.

Como afirmaram recentemente os juízes do Tribunal de Contas, além do incumprimento dos limites de endividamento, o Executivo também não cumpre as regras de execução orçamental, incluindo as regras de contratação pública e de prestação de contas.

Estas regras, Excelências, fazem parte da Lei que vamos votar em breve. Por esta razão, neste ponto prévio, pedimos que os senhores representantes do Titular do Poder Executivo esclareçam aos angolanos o seguinte:

Se os limites orçamentais de endividamento aprovados pela Assembleia Nacional não são respeitados, se as regras e princípios de execução orçamental aprovados pela Assembleia Nacional não são respeitados pelo Titular do Poder Executivo, para que serve a aprovação que nos solicitam?

Para que servem as intervenções de mais dois poderes do Estado se um dos poderes se sente no direito de pisotear a Constituição e de não respeitar a Lei?

Se a Lei da Sustentabilidade das Finanças Públicas, que estabelece o limite de endividamento do País, não está a ser cumprida, não há dúvida alguma que o País está a contrair dívidas que a Assembleia não aprovou. Qual é o valor absoluto desta dívida não aprovada? Quem são os credores? Quais são os seus termos?

Quando o Executivo pretende efectivar as Autarquias Locais e qual é a verba para a organização e realização das Autarquias Locais nos 164 municípios do País?

Terá o Executivo vontade política e patriótica para respeitar as Recomendações da Assembleia Nacional e os Pareceres do Tribunal de Contas?

Estará o Executivo comprometido com a transparência nos processos de contratação pública e limitar a adjudicação directa ao estritamente necessário e nos termos da lei?

Deverá o Executivo respeitar a Constituição, a Lei do Orçamento, a Lei da Sustentabilidade das Finanças Públicas e a Lei da Contratação Pública?

A Assembleia Nacional deve, no quadro da sua competência de controlo e fiscalização, “velar pela aplicação da Constituição e pela boa execução das leis”. Assim, vimos solicitar posicionamento sobre as seguintes questões:

É legítimo e patriótico que se aprove um Orçamento Geral do Estado que vai afectar quase 60% das suas receitas para pagar dívida sem que os representantes legítimos do Povo saibam a quem o Estado deve, quanto deve, em quanto tempo vai pagar e quais os juros devidos?

Será patriótico e moralmente aceitável votar um orçamento que não prevê valores para a institucionalização efectiva das Autarquias Locais?

Será democrático e legítimo que se vote um OGE para financiar o Estado repressivo e persecutório de adversários políticos, jovens activistas, jornalistas, sindicalistas, empresários, trabalhadores e zungueiras?

Será política, ética, moralmente justo e patriótico votar um Orçamento Geral do Estado que não tem as crianças como prioridade e exclui mais de 2 milhões delas do sistema de ensino primário obrigatório e gratuito sem o mínimo de sensibilidade do Executivo?

Será Angola uma República credível quando não cumpre os compromissos internacionais assumidos para as dotações orçamentais da Educação (20%), Saúde (15%) e Agricultura (10%)?

Será o Estado de direito efectivo quando o Presidente do Tribunal Supremo é suspeito de crimes de corrupção, peculato, mas é protegido?

A Assembleia Nacional não deve continuar a fechar os olhos à utilização de linhas de crédito para o financiamento da contratação simplificada, fazendo crescer a dívida pública. Este expediente que se tornou prática comum com o actual Presidente da República, atenta a transparência e a boa governação por regularmente ignorar a realização de concursos públicos.

Antes de se proceder à apresentação do Relatório Parecer e do Projecto de Resolução que aprovam a Proposta de Lei do OGE 2024 é de elementar justiça e dever patriótico que os angolanos sejam informados e esclarecidos pelo Executivo e pela Mesa da Assembleia Nacional sobre as questões suscitadas pelos angolanos que representamos.»

Folha 8 com Lusa

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